Um Racista no Brasil
"Je trouve à ce pays un climat détestable/Je n'en garderai pas un fort bon souvenir/ L'air est souvent brumeux el le froid redoutable/ On ne m'y verra pas de longtemps revenir"("Encontro nesse país um clima detestável/ dele não guardarei boa recordação/ o ar é freqüentemente nublado e o frio terrível/ para lá não voltarei tão cedo")
Conde de Gobineau - Amadis, 1876
Paisagem do Rio de Janeiro imperial
Mal o conde Gobineau colocou os pés no cais da Baía da Guanabara, declarou guerra aos da terra. Não hesitou muito em classificar o país como um império de malandros. O calor, as baratas, os insetos de todos os tamanhos, os ratos audazes que cruzavam as casas por todos os lados, as cobras que passeavam pelos jardins, sapos grandes como cachorros, e até vôos rasantes de morcegos fizeram com que ele imaginasse se encontrar num anexo do inferno. E, olhando aquilo tudo, indiferente, com um cigarro enfiado na orelha e um palito no canto da boca, eis o carioca, um contumaz vadio incapaz de qualquer iniciativa.
Beleza sem "natureza moral"
Gobineau no Brasil, ao contrário de Tocqueville na América do Norte, não percebera, ou não quis ver, que o problema da pouca dedicação ao trabalho com que ele se deparou no Brasil devia-se à existência da escravidão. Enquanto Tocqueville, ao comparar os estados de Ohio (livre), com o Kentuky (escravista), deixou páginas de inteligente observação sobre os estragos que o regime servil provocava nos brancos sulistas, deixando-os apáticos, menosprezando o esforço físico, o conde Gobineau atribuía a malevolência que encontrou no Brasil ao miscigenismo. O Rio de Janeiro, disse ele, assemelhava-se a "uma bonita donzela inculta e selvagem que não sabe ler nem escrever", uma paisagem exuberante emoldurada com florestas sensacionais, mas que não estavam impregnadas de "natureza moral". Naquele descalabro - onde o até o círculo diplomático encontrava-se "estagnado em sua própria imbecilidade" - salvava-se o imperador.
Medo da Miscigenação
Ambulantes no Rio de Janeiro
D. Pedro II, homem culto, estimava Gobineau, reservando-lhe horas de boa e variada conversa, não evitando, entretanto, que ele fosse também um outro francês acometido por um "terror religioso" no Novo Mundo. O medo dele porém era outro. Não temia a democracia que por aqui não havia, mas sim um mundo devastado pela miscigenação, quando não pelo absoluto reino da vadiagem. O mau humor de Gobineau nunca o abandonou, mesmo com o imperador correspondendo-se com ele até um pouco antes da sua morte, em 1882, parece que nunca deixou de praguejar contra o que viu no Brasil.
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